Crítica: "Oppenheimer"
- Clara Ballena
- Jul 20, 2023
- 3 min read
É muito difícil não conhecer o trabalho de Christopher Nolan e admirar o seu fascínio por histórias que seguem diferentes linhas do tempo e a utilização de efeitos práticos ao invés do familiar CGI. Sem fugir do seu padrão que o consagrou, mas mantendo os “pés no chão” para tratar com mais familiaridade e clareza conteúdos complexos, “Oppenheimer” é um desconcertante vislumbre visual e sonoro.

O longa narra a história do físico J. Robert Oppenheimer (Cillian Murphy) em dois momentos de sua vida: Enquanto trabalha no projeto Manhattan durante a segunda guerra mundial (Em uma corrida para desenvolver a primeira arma nuclear) e anos à frente, em uma audiência para revogar sua habilitação de segurança guiada pela perspectiva de Lewis Strauss (Robert Downey Jr.). Dividindo-se para além dos pontos de vista, utilizando da palheta de cores para diferenciar a perspectiva dos personagens em diferentes períodos, o filme baseado na obra literária “Oppenheimer: O triunfo e a tragédia do Prometeu americano” consegue imergir ambas linhas temporais de maneira fluida e instigante, fazendo as 3 horas de duração do filme passarem despercebidas.
Por se tratar de uma produção baseada em fatos reais, Nolan repassa a vida de Oppenheimer nos fazendo entender o personagem em rápidas cenas, com uma descontinuidade na edição temporal, mas sem perder a essência do personagem, e isso se dá bastante pela atuação de Cillian Murphy, que com proeza encara diferentes anos de vida do seu personagem. Construindo camadas e complexidades ao seu personagem, é interessante observar a tentativa do filme de não colocá-lo como um herói, mas como um ser que se divide em igual pela sua genialidade e ego.

As explicações científicas são fáceis de se compreender no universo, e os diálogos expositivos fornecem uma nova camada de relação entre a audiência e o produto final. Quando estamos acompanhando a perspectiva do protagonista, somos sugados pelo seu olhar de mundo, incrementado por metáforas sensoriais que enriquecem o longa e nos aproxima do personagem principal. Há uma poética que ao mesmo tempo aterroriza e encanta o olhar do personagem aos fenômenos incompreendidos da natureza, e contemplá-los junto com ele somente enriquece a jornada com um aspecto visual impecável.
A sugestão, se possível, é assistir ao filme em uma sala IMAX. Com a potência sonora que chega ao ponto de sentir a vibração da cadeira somente pela sonoridade, e com uma tela de 16 metros de altura por 22 metros de comprimento, a imersão bem trabalhada e filmada com câmeras IMAX se torna mais um elemento atrativo para o filme.

(Nolan e sua equipe nos bastidores do filme)
A direção sem muita elaboração acaba por enriquecer-se pelos efeitos práticos. É algo grandioso, inimaginável e de deixar de queixo caído a cena que reproduz o primeiro teste da bomba atômica. Mas, não espere um filme carregado de explosões. Comandado pelos diálogos e trilhando um caminho carregado de tensões pela trilha sonora imersiva, não espere um filme estilo Michael Bay, com explosões a cada 5 segundos.
Com um roteiro enriquecido de personagens complexos, as atuações de Cillian Murphy e Robert Downey Jr. são certeiras para indicações de grandes premiações. Ambos carregam a perspectiva dos seus personagens, trazendo lados e subjetividades intrigantes, que merecem ser reverenciadas pelo excelente trabalho. Infelizmente, Nolan ainda falha em representar personagens femininas (Por pouco não sendo um desastre completo, isso graças a Emily Blunt, representando fervorosamente e de modo estonteante a personagem Kitty Oppenheimer). Existe a presença feminina em ambientes interessantes, mas que estes não passam de pequenas interlocuções ou completamente carregadas pelo Male Gaze*, como nas cenas de nudez da personagem Jean Tatlock, interpretada por Florence Pugh.
“Oppenheimer” é grandioso em todos os sentidos: É interessante, impactante e surpreendente. Sendo a retomada de Christopher Nolan a uma sobriedade narrativa que pode lhe garantir premiações, é um olhar para a história de J. Robert Oppenheimer não como um herói ou vilão, mas sim um destruidor de mundos.

*ato de retratar as mulheres no mundo, nas artes visuais e na literatura a partir de uma perspectiva heterossexual masculina, que apresenta e representa a figura da mulher como objeto sexual para o prazer do espectador homem.
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