Review de "O Menino e a Garça"
- Helena Vilaboim
- Feb 20, 2024
- 3 min read
Aos 83 anos de idade, o cineasta e animador Hayao Miyazaki dirigiu em 2023 o que está sendo entendido como seu último filme pelo reverenciado Studio Ghibli: o longa “O Menino e a Garça”, projeto completamente feito em animação tradicional 2D, que compete na categoria de “Melhor Animação” no Oscar 2024, rivalizando com um dos favoritos da Netflix, “Nimona”.
“O Menino e a Garça” é um longa de 2 horas e 4 minutos que chega aos cinemas brasileiros no dia 14 de fevereiro de 2024. Ele segue o garoto Mahito (Soma Santoki), que perde a mãe durante um bombardeio no Japão durante a segunda guerra mundial. Ele e o pai então se mudam para o interior do país, onde o pai se casa novamente. Tentando se adaptar a um local novo ainda passando pelo luto. Mahito entra em contato com um mundo mágico que vai mudar o curso de sua vida.
Diferentemente do que o título sugere, o filme é uma exploração sobre temas densos, como luto e criatividade, apesar de serem apresentados ao público sob o olhar de uma criança. Intitulado “Como Você Vive”, (君たちはどう生きるか) no japonês original, o longa passa a ter um teor mais autobiográfico e até um tanto instrucional para aqueles que conhecem um pouco da história do diretor e são sensíveis aos temas abordados durante a história.
Responsável por trazer às telonas títulos como “O Castelo Animado”, “Princesa Mononoke” e “Sistema de Entregas da Kiki”, o Studio Ghibli se tornou iônico pelo estilo de animação 2D, encantando milhares de espectadores pelo mundo. O estúdio também é bastante conhecido por sua abordagem singela de temas importantes e profundos, seja da natureza humana ou de sua relação com o ambiente ao redor.
“O Menino e a Garça” traz esses mesmos elementos, apresentados pela visão de mundo de um garoto que conheceu intimamente o sofrimento da perda de um ente querido, mas que reconhece a inevitabilidade desses acontecimentos, e por isso, diferente de algumas outras obras de Miyazaki, Mahito não entra no mundo mágico com a intenção de salvar a mãe que já faleceu, mas de resgatar alguém que ainda pode ser salvo.
Esse longa é um filme impactante, tanto pela beleza da animação tradicional que entrega imagens belíssimas que, verdade seja dita, não se encontra em muitos filmes de animação 3D de estúdios grandes nos dias de hoje; quanto pela mensagem que é constantemente passada ao telespectador durante o filme, e que fica com o telespectador por bastante tempo.

A duração de mais de 2 horas é algo que surpreende, já que normalmente filmes de animação são mais curtos, e “O Menino e a Garça” pode parecer um tanto redundante em algumas partes do filme, principalmente no primeiro ato, em que Mahito quase entra no mundo mágico diversas vezes. Há algumas linhas de narrativa que não necessariamente influenciam na final, e que certamente seriam cortadas do produto final, mas em termos de desenvolvimento de personagem, são essenciais.
No entanto, esses minutos extra são muito bem empregados em algo que o Studio Ghibli faz muito bem: a ambientação daquele mundo novo. “O Menino e a Garça” coloca filmes de animação contemporâneos no chinelo, e facilmente desafia a ideia de que a animação 2D é limitada. As imagens são belíssimas, inusitadas e mágicas, recorrendo muito á uma sensação de sonho que é bastante frequente em outras produções do estúdio.
Mas o tesouro do filme é a mensagem final. Conhecendo Miyazaki, ou não, a mensagem penetra profundamente no espectador: a noção de que a criação da arte tem um grande poder sobre a mudança do mundo real em um lugar melhor e, pelo menos ao meu ver, essa parece ter sido a missão do cineasta a partir de seus projetos.
É ainda minha opinião que o filme se beneficiaria muito mais se o título tivesse sido traduzido do original em japonês, e não da tradução em inglês (“The Boy and the Heron”), pois embora “O Menino e a Garça” tenha uma sensação onírica, que certamente traduz boa parte do filme, “Como Você Vive” contaria muito mais da alma do projeto.
Aos fãs do estúdio e amantes de animação, “O Menino e a Garça” é um filme que precisa ser assistido numa tela de cinema. A experiência é única, e é possível que esse seja, realmente, o último projeto de Hayao Miyazaki, e não há jeito melhor de apreciar isso do que com a melhor experiência possível.
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