"A Queda da Casa Usher": O terror de não ter controle
- Helena Vilaboim
- Oct 20, 2023
- 4 min read
Conhecido por suas adaptações fiéis e reverentes à obra original, Mike Flanagan trouxe ao público algumas das obras de terror que mais marcaram sua parceiria com a Netflix nestes últimos anos.
Alguns de seus títulos mais bem falados como "A Maldição da Residência Hill", "Clube da Meia-Noite" e "A Missa da Meia Noite" foram adaptados de grandes nomes da literatura do terror como Shirley Jackson, Christopher Pike e F. Paul Wilson respectivamente, com grande sucesso e atenção aos detalhes.

"A Queda da Casa Usher" (The Fall o the House of Usher) nos apresenta um encontro de mentes muito oportuno, senão ambicioso, mas que certamente se provará uma das melhores produções da Netflix, fechando com chave de ouro o contrato de Flanagan com a plataforma.
A minissérie, que conta com apenas 8 episódios de mais ou menos 1 hora cada é em essência, uma carta de amor ao teor macabro e misterioso das obras de Edgar Allan Poe que muito influenciaram os trabalhos do próprio Flanagan. Nessa série, são adaptados alguns dos contos mais famosos de Poe como "A Máscara da Morte Rubra", "O Gato Preto" e claro "A Queda da Casa Usher"
"A Queda da Casa Usher" é contada de maneira não linear e segue os irmãos Roderick (Bruce Greenwood) e Madeline (Mary McDonnall) Usher, donos de uma das maiores empresas farmacêuticas do mundo. Quando os filhos de Roderick começam a morrer um por um de formas brutais, os irmãos são forçados a lembrar da sua trajetória até o poder quase absoluto e os tratos que fizeram pelo caminho.
Diferente de projetos anteriores de Mike Flanagan, nesta obra, é preciso que a audiência se esqueça muito do que aprendemos ao longo de suas séries sobre a dinâmica de uma família que se ama. Os Ushers são os típicos herdeiros e empresários de coração frio, a quem regras não se aplicam e não se preocupam com a pilha de corpos que cresce desde que o dinheiro continue entrando na conta.
Essa é uma história sobre corações partidos, almas corrompidas, gula e inanição, tendo como cereja do bolo uma âncora sobrenatural justiceira que casa tão bem em uma narrativa como essa.

Como de costume, Flanagan juntou um elenco já bastante conhecido de outros projetos, incluindo Kate Siegel, Rahul Kholi, Henry Thomas, T'Nia Miller, Samantha Sloyan e outros.
O elenco, já acostumado com a visão de Flanagan, não tem nenhum problema em fazer cada segundo contar, mesmo com muitos dos personagens sendo alguns deles projetados para serem unidimensionais, justamente por sua rápida participação na série.
Do elenco, quem tem mais tempo de tela e espaço na narrativa são Carla Gugino, Bruce Greenwood, Mary McDonnall e Carl Lumbly, que entregam performances sensacionais, com direito a alguns dos melhores diálogos e monólogos já escritos no "Flanaverse".
Os roteiros, assinados pelo próprio Flanagan, são propositalmente confusos e vagos, entregando parte da narrativa em um momento e dividindo as outras parcelas entre passado e presente usando a ferramenta da confissão de Roderick para fazer os saltos temporais.
Embora seja algo que já tenha funcionado em projetos como "Hill House", "A Queda da Casa Usher" sofre pela antipatia que os personagens causam na audiência, seguida da fórmula de confissão fica repetitiva rapidamente, arriscando o engajamento do público com a história.
A sensação que fica é que Flanagan se concentrou em escrever momentos maravilhosamente bem, mas perdeu a mão na junção deles em algo maior e mais coeso. Contudo, o fato de ser algo que se repete pelos episódios acabar por formar um padrão com a qual a audiência acaba se acostumando.
Enquanto “Hill House”, “Clube da Meia Noite” e “Missa da Meia Noite” têm o luto como tema central e de onde toda a narrativa parte, Flanagan quebra esse padrão introduzindo uma história que é regida pela inveja e mais ainda pela raiva em “A Queda da Casa Usher”.

Muito ligada a isso, a alma da série é a presença constante da personagem de Carla Gugino, que não tem nome nem objetivo definido. Ao longo da série isso se torna bastante irônico, pois a personagem parece ser a personificação da morte.
De longe a maior e melhor personagem da atriz em séries de Flanagan até o momento, sua benevolência ou maleficência fica por conta da audiência, que pelo simples antagonismo à família Usher é compelida a, até um certo grau, torcer por ela.
A presença da personagem de Gugino é quase catártica para muitas pessoas na audiência, o único senso de justiça que pune esses personagens que mais assemelham monstros humanos.

Fora Gugino, Bruce Greenwood é o ator que chama mais atenção. A tragicidade de seu personagem é algo que cativa, mas ao mesmo tempo enoja e impressiona. Também um velho conhecido de Flanagan, tendo compartilhado a cena com a própria Gugino, não foi o primeiro ator escalado para o papel;
Nos flashbacks, certamente a audiência ficará cativada por Willa Fitzgerald, que faz o papel da jovem Madeline, com toda a sua fome, raiva e ambição. Ela tem uma qualidade bastante manipuladora, que se perde na versão mais velha. A atriz é magnética e interessante, certamente será uma dos rostos mais usados em possíveis
"A Queda da Casa Usher" é certamente uma das melhores adaptações de Flanagan, talvez ficando atrás somente de "Hill House". Ele se distancia da exploração de sentimentos humanos mais violentos e feios, e foca mais em crítica social.
"A Queda da Casa de Usher" também se diferencia por não mostrar a violência só nos diálogos e ações sutis, mas também na formação das cenas de morte, algumas sendo verdadeiros espetáculos visuais, fazendo a audiência ficar presa em cada detalhe excessivo.
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